terça-feira, 23 de dezembro de 2008

Até que a morte os separe



PDF Imprimir E-mail
Escrito por DARLYSON FEITOSA
12-Dec-2008

Cerimônia de casamento é algo paradoxal: é um misto de simplicidade e sofisticação, de cansaço e prazer, de marasmo e frenesi. Apetrechos mil em casamentos modernos: rapazes e moças vestidos de preto com cara de segurança de presidente, manobristas, equipes de fotografia, som, vídeo, alimentação. O oficiante (Ah! O oficiante!) despeja teologia, eclesiologia, filosofia, psicologia sobre noivos atônitos, cansados, ansiosos. Conquanto pudéssemos refletir melhor sobre o casamento instituição divina, a cerimônia de casamento, instituição humana, é mesmo algo intrigante.

A lei faculta ao sacerdote de confissão religiosa a liturgia, a ordem, a ênfase a ser exposta ou seguida na cerimônia. Não há uniformidade. Há cerimônias serenas, outras frenéticas. Há prédicas inspirativas, outras deselegantes. (Quis certa vez enfiar-me debaixo da mesa ao ouvir um sermão de casamento sobre as 10 áreas onde a mulher deve ser submissa ao marido.) Ainda assim, detenho-me aqui numa parte presente em quase todas as cerimônias: os votos matrimoniais. São eles que selam a união. É o momento solene do “prometo”. É o momento do “até que a morte os separe”, expressão mais do que em xeque em tempos hipermodernos. Não raro os votos chamam mais a atenção de todos do que o sermão. Ocorre que cada vez mais há novas promessas, novos textos, novos votos. Há oficiantes de mente criativa (de boa e de má qualidade, registre-se!), de modo que os votos podem ser promessas factíveis ou absolutamente utópicas.

Respeitando (e não poderia deixar de ser) essa imensa liberdade que nos é dada nas cerimônias de casamento, não mais do que uma mera sugestão para os votos matrimoniais poderiam ser assim requeridas:

1. Prometo cuidar da minha saúde física. Que benefícios tremendos isso traria para o casal! Cuidar da saúde do cônjuge é muito difícil. Os cônjuges não podem controlar a alimentação empresarial, burocrática e apressada que se faz nos grandes centros urbanos, senão com disciplina pessoal. Conciliar horários para exercícios é um desafio. Mas ambos têm condições de se disciplinarem, onde estiverem, pensando em se cuidar para o outro por amor. Se os noivos, ali na cerimônia, prometessem um para o outro que cada um faria exames regulares durante a vida conjugal, que cuidariam do peso, poderia não soar romântico, mas seria uma promessa e tanto!

2. Prometo cuidar da minha saúde emocional. Nessa correria em que vivemos, com muito mês para pouco salário, a concorrência no mercado de trabalho, a violência urbana... haja saúde! Isso tem influência direta no relacionamento conjugal. Os cônjuges que trabalham foram chegam em casa chutando o totó, chutados que foram durante o dia. Se torcem pelos times do Rio de Janeiro, aí é que as aflições se multiplicam! Cuida-se das emoções compreendendo-se a realidade e olhando com lucidez para a vida. O romantismo do namoro se depara com um cotidiano conjugal nem sempre ameno. Tensões, preocupações, contas a pagar, doenças têm capacidade de provocar ira, frustração e conseqüente abalo emocional. Tenho a esperança de ainda ouvir cônjuges prometendo que cuidarão do volume de voz durante as conversas e discussões, que ouvirão música juntos (mesmo que um deles seja fã do brega ou de música para matar mamute).

3. Prometo cuidar da minha saúde espiritual. Por pudor, desinformação ou desleixo mesmo, casais vão para a lua-de-mel sem Jesus. Não levam a Bíblia. Não oram. É um contra-senso: acabaram de pedir a bênção de Deus, e logo se despedem dele. A saúde espiritual do casal começa no namoro, mas é no início da vida conjugal que ela deve ser colocada como prioridade. Fazer isso depois pode demorar décadas ou sequer acontecer! Prometer cuidar da saúde espiritual é uma promessa nobre. Implica em maturidade e em humildade. Quando um dos cônjuges não tem fé, não crê em Jesus ou é um(a) “amigo(a) do evangelho” (o que é isso mesmo?), tal promessa seria uma saia justa durante a cerimônia. Todavia, para que desejam a bênção de Deus se não podem prometer que irão cuidar do relacionamento com Ele?

Note que as promessas acima são pautadas no “eu”. Não se trata de fomentar aqui o fenômeno pós-moderno da individualização. Pelo contrário, as promessas estão centradas no “eu” por ser comum a prática de se esperar do outro as iniciativas.

À semelhança do que ocorre com as promessas tradicionais, as aqui sugeridas são passíveis de se tornarem meras palavras cerimoniais. Contudo, creio que os votos matrimoniais poderiam ser caracterizados com melhor objetividade. As agruras do cotidiano têm levado vantagem sobre as promessas. Cuidando da saúde física, emocional e espiritual quem sabe os cônjuges não teriam melhores chances de serem, de fato, separados somente pela morte!

DARLYSON FEITOSA

Pastor, colaborador de OJB

darlyson@uol.com.br


EXTRAÍDO DE: www.ojornalbatista.com.br

0 comentários: