sexta-feira, 1 de maio de 2009

Mutilaram a grande comissão



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Escrito por LÉCIO DORNAS
29-Apr-2009

A chamada grande comissão designa o supremo mandado do Senhor Jesus dirigido aos seus discípulos nos momentos que antecederam sua ascensão. Foram palavras fortes e firmes, pronunciadas, creio, com serenidade e seriedade.

Uma possível análise do conteúdo da grande comissão é a que parte de seus verbos, pois, como se trata de um mandado, a indicação da ação pretendida é dada pelos verbos ir, pregar, batizar e ensinar. Na verdade, por estarem no presente contínuo da língua grega, estes verbos ficam mais precisos caso sejam colocados no gerúndio: indo, pregando, batizando e ensinando. Assim, é bem mais consentâneo com a ideia da igreja peregrina (pairokia ): enquanto a Igreja segue sua peregrinação neste mundo vai pregando o Evangelho do Reino, chamando os convertidos ao compromisso do batismo e os discipulando através do ensino da Palavra de Deus.

Ir é viver, pregar é testemunhar, batizar é comprometer, ensinar é amadurecer. Desta forma, Jesus Cristo expôs sua visão para a Igreja que acabara de edificar: a Igreja de Jesus existe para peregrinar. Enquanto peregrina, segue testemunhando do seu Senhor. Á medida que seu testemunho reverbera nas vidas, a Igreja integra-as e compromete-as pelo batismo, tudo isso sem descuidar do ensino das Escrituras, por meio do qual a mente de Cristo vai sendo formada nas pessoas. Como é linda e relevante a visão de Jesus para a sua Igreja!

No entanto, a manutenção da integridade da grande comissão é condição sine qua non para que a Igreja seja essa potência maravilhosa, movida por graça e amor, sonhada pelo Senhor Jesus. Ou seja, é preciso colocar para funcionar a força dos quatro verbos. Privilegiar ou ignorar qualquer deles resulta comprometer toda a visão e, assim, a própria ação histórica da Igreja.

E aqui chegamos a uma realidade muito triste no cenário da Igreja de Jesus no Brasil em nossos dias: mutilaram a grande comissão retirando dela, na práxis da Igreja, o mister educacional. Por difícil que seja, é preciso admitir que, muitas vezes até mesmo em nome de ênfases importantes, até mesmo constantes na mesma grande comissão, a Igreja vem tentando crescer e cumprir seu papel sem encarar o desafio educacional com a seriedade que precisaria para assegurar desenvolvimento sadio, consistente e sustentável.

O problema é que a práxis cristã evangélica precisa fundamentar-se em princípios teológicos sólidos, que só emergem a partir de uma ação educacional correta e efetiva. Tentar chegar a uma prática correta (ortopraxia) sem os valores corretos (ortodoxia) descamba para a religiosidade ou até mesmo para uma reedição hoje do farisaísmo do primeiro século.

Esta mutilação pragmática precisa ser não apenas denunciada, como faz este texto, mas encarada com destemor e assertividade. Corremos sério risco com o descaso vigente para com a educação cristã. Tanto no contexto da igreja local, onde o ensino na Escola Bíblica é praticado de forma amadora, o treinamento segue simplesmente inexistindo na maioria das igrejas, o discipulado ainda sem espaço no cenário e o processo de amadurecimento na vida dos crentes adiado sine die. Não é difícil avaliar o prejuízo que se prenuncia para a Igreja no Brasil se esta tentativa de se observar a grande comissão pela metade não for imediatamente interrompida em favor de uma visão integral do mandado do Mestre.

Na verdade, já temos contabilizado muitos prejuízos. Basta olharmos a discrepância espelhada nas nossas estatísticas. O programa de educação religiosa executado pelas igrejas batistas do Brasil alcança um percentual ainda irrisório do universo batista brasileiro. Tanto na Escola Bíblica Dominical quanto na Divisão de Crescimento Cristão temos o enorme desafio de conquistar, para o programa praticado, a maioria dos membros de nossas igrejas. Infelizmente, o que criticávamos na década de 80 nas denominações então recém-surgidas, onde os membros só frequentavam os cultos, está acontecendo conosco hoje. É nos cultos que a grande maioria dos membros de nossas igrejas se faz presente, não mais das classes de EBD ou nas organizações de treinamento e missões.

O futuro que se prenuncia não é dos melhores. Precisamos encarar o desafio de rejeitar esta versão mutilada da grande comissão, assumindo um compromisso com o ir, o pregar, o batizar e o ensinar... Todas as coisas que o Senhor Jesus nos mandou.

Quem sabe não seja este o momento de assumirmos e revitalizarmos a Escola Bíblica Dominical e nela investirmos com seriedade, consequência e efetividade? O Senhor Jesus deixou claro o nosso dever de ensinar... Façamos isso com dedicação, como exortou o apóstolo Paulo (Romanos 12.7).

Por uma práxis da grande comissão sem mutilações!

LÉCIO DORNAS

Pastor da Igreja Batista Dois de Julho, em Salvador (BA)

lecio-d@terra.com.br


EXTRAÍDO DE: www.ojornalbatista.com.br

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